8 de dezembro de 2015

Minha Mãe



A dada altura, no filme Minha Mãe, de Nanni Moretti (2015), Margherita (a personagem da realizadora, representada por Margherita Buy) explica a uma actriz atónita: “Não quero ver só a personagem; também preciso de ver a actriz.” Talvez seja mais fácil compreender esta afirmação se pensarmos nas figuras principais de Minha Mãe: dois filhos que vão perder a mãe. Até aqui, na obra de Moretti, o realizador representou sempre, se não o papel do protagonista, pelo menos alguém cujos comentários ou intervenções eram essenciais para o desenrolar da acção. Neste filme, em contraste, a sua personagem apaga-se e mantém-se em silêncio durante a maior parte do tempo. A vertente verbal das crises cabe a Margherita, personagem que parece ter sido fabricada precisamente para que Nanni conseguisse ouvir-se e ver-se a si próprio não só como realizador, mas também como filho em luto, replicando e clarificando o desdobramento sugerido na direcção de cena por Margherita. Num filme luminoso como Querido Diário (1993), Nanni Moretti enfrentava a possibilidade da própria morte com um sentido de humor e uma intensidade que acentuavam a beleza da vida. Em Minha Mãe, no entanto, a perda lança as personagens numa crise que as leva a pôr em questão a sua própria existência: a realizadora questiona o modo como se relaciona com as pessoas, enquanto o irmão, representado pelo próprio Moretti, decide abandonar o emprego. Mesmo a componente cómica do filme (relacionada principalmente com a actuação de John Turturro – por sinal um dos mais subaproveitados actores de Hollywwod – como actor no filme dentro do filme) contribui para acentuar a melancolia e a sensação de incapacidade de lidar tanto com as pequenas como com as grandes catástrofes da vida. Estamos muito longe do histrionismo egocêntrico de filmes como Sonhos de Ouro (1981) ou Palombella Rossa (1989), centrados na personagem recorrente de Michele Apicella, mas mantém-se como denominador comum a tentativa de mostrar as neuroses e ansiedades de personagens colocadas perante o desafio de lidar com as expectativas daqueles que as rodeiam.