12 de fevereiro de 2017

Uma Discussão com 50 Anos


O documentário Uma Discussão com 50 Anos (The 50 Year Argument, 2014), co-realizado por Martin Scorsese e David Tedeschi, segue um figurino muito semelhante ao de outros que o Cinéfilo Preguiçoso abordou anteriormente, como Trespassing Bergman ou Vida Activa: O Espírito de Hannah Arendt: uma sucessão de depoimentos intercalados com imagens de arquivo. Será que este formato reúne aceitação consensual entre a comunidade documentarista como o modo mais eficaz de discutir ou homenagear uma personalidade ou instituição? O pretexto deste filme é a festa do 50.º aniversário da revista New York Review of Books, fundada em 1963. O tom combina bem com a ocasião: a grande maioria das intervenções assumem um tom francamente laudatório do espírito da revista, da sua tradição de independência intelectual e intervenção em questões sociais (da guerra do Vietname ao movimento “Occupy Wall Street”) e, em particular, da personalidade de Robert Silvers, que a edita desde a fundação (em colaboração com Barbara Epstein, até à morte desta, em 2006). A conduta predominante de Silvers enquanto editor assenta numa ideia simples: convidar autores inteligentes e cultos a escreverem sobre determinado livro ou assunto (não necessariamente dentro da sua especialidade), sem intervir demasiado a não ser para sugerir leituras de pontos de vista diferentes a debater. Analogamente, um documentário onde se vêem e ouvem pessoas do calibre intelectual de Isaiah Berlin, Susan Sontag, Mary Beard, Joan Didion, Mary McCarthy ou Timothy Garton Ash não pode deixar de ser cativante, mau grado o formato algo convencional. É talvez de lamentar que Scorsese e Tedeschi, apesar de um título que salienta a importância da discussão de perspectivas divergentes na New York Review of Books, não tenham apresentado pontos de vista menos abonatórios em relação a esta. O documentário funciona como um prolongamento em forma de filme da festa das bodas de ouro desta revista que continua a insistir na urgência de pensar e debater, numa era em que a superficialidade e a intoxicação mediática ganham terreno a um ritmo assustador. (Nota final: no final desta sessão, o Cinéfilo Preguiçoso teve a grata surpresa de se cruzar com uma multidão que enfrentou a chuva para assistir à projecção de Vida Activa: o Espírito de Hannah Arendt, no cinema Ideal.)