Esta
semana o Cinéfilo Preguiçoso viu dois filmes, um italiano e outro americano. O
interesse suscitado por Feliz como Lázaro
(2018), de Alice Rohrwacher, levou-o a procurar em DVD um filme da mesma
realizadora intitulado O País das
Maravilhas (2014). Merecidamente distinguido com o Grande Prémio da edição
de 2014 do Festival de Cannes, O País das
Maravilhas conta a história de uma família de apicultores com um modo de
vida próximo da natureza, na antiga região da Etrúria (que actualmente corresponde
às zonas da Toscânia, do Lácio e da Úmbria). A atenção da realizadora não
contorna as dificuldades do trabalho desta família em que todos os membros,
mesmo os mais novos, sob comando de um pai ríspido e autoritário, têm de
trabalhar, em detrimento dos passatempos e interesses típicos da infância e do
início da adolescência. O olhar sobre o esforço físico e as actividades relacionadas
com a apicultura é enquadrado, por um lado, pelas cores frias e ácidas da
paisagem, por outro, pelas diferentes camadas temporais deste espaço específico
e da Itália em geral, com todo o folclore televisivo e turístico que a
caracteriza. Como acontece em Feliz como
Lázaro, Alice Rohrwacher, realizadora admirável tanto pelo pensamento como
pelas imagens, consegue fazer um filme belíssimo e quase fantasmagórico, situado
numa dimensão temporal dúbia, mais próxima da fluidez da memória. Apesar de não escamotear os aspectos mais
concretos e duros dos assuntos abordados, consegue captar as suas características
mais poéticas e inesperadas: a presença constante das abelhas, o mel a transbordar
de um balde e a inundar as lajes do chão, uma tarde passada no lago, a defesa das
colmeias contra o vento, a presença estranha de um camelo. Do filme Can You Ever Forgive Me? – Memórias de Uma
Falsificadora Literária (2018), de Marielle Heller, visto no videoclube de
uma operadora de telecomunicações, falou-se um pouco por altura dos Óscares,
visto que Melissa McCarthy recebeu uma nomeação (justa) para melhor actriz
principal. O que atraiu o Cinéfilo Preguiçoso foi o facto de este filme se
basear numa autobiografia de Lee Israel, que descreve o período em que esta escritora,
em pleno bloqueio literário, se dedica ao negócio da falsificação de cartas de
escritores famosos para conseguir sobreviver. Can You Ever Forgive Me? começa bem, parecendo preparar-se para decorrer
ironicamente no meio literário, sob o signo da comédia romântica – apesar de os protagonistas serem uma mulher e um homem
homossexuais –, com banda
sonora típica, entre jantares de escritores, livrarias, coleccionadores e Nova
Iorque à noite. A dada altura, no entanto, fica-se com a sensação de que o filme,
assustado com a sua própria invulgaridade, decide transformar-se num dramalhão
insuportável por não querer confundir os espectadores e/ou falhar
comercialmente, assim desperdiçando um tema riquíssimo e aquilo que se imagina
ser o sentido de humor da protagonista.