21 de abril de 2024

Passages

Será que, em Portugal, Passages (Ira Sachs, 2023) não vai estrear em sala? Por via das dúvidas, como gostou muito de ver O Amor É Uma Coisa Estranha (2014) e Homenzinhos (2016), do mesmo realizador, o Cinéfilo Preguiçoso decidiu ver este filme em DVD. Se os dois títulos referidos deixam os espectadores com a sensação de que assistem à vida em si, Passages leva esta ideia muito mais longe. Em Tomas (Franz Rogowski), temos uma personagem que é puro desejo em movimento – uma força da natureza. As cenas longas em que Tomas percorre as ruas de Paris de bicicleta ilustram bem a dinâmica do filme. Oscilando entre o marido (Martin/Ben Whishaw) e uma mulher (Agathe/Adèle Exarchopoulos) com quem começa a relacionar-se numa discoteca, Tomas, realizador de cinema, espalha a infelicidade e a insatisfação em seu redor. Mais do que hesitação, estas oscilações parecem sugerir o desejo de fazer coexistir na sua vida o amor de Martin e Agathe, sem que um exclua o outro. O realizador explora toda esta fluidez, assim como a inevitável frustração de Tomas, filmando as personagens em situações desconfortáveis, mas sem grandes excessos melodramáticos nem preocupações psicológicas ou moralizantes: vemos simplesmente as acções de Tomas e as reacções das outras personagens. O filme depende muito da linguagem corporal dos actores e da capacidade destes de comunicarem sem palavras. Numa entrevista, Sachs falou da influência de John Cassavetes. Ao contrário do que se passa no cinema de Cassavetes, porém, as personagens de Sachs não passam muito tempo a reflectir sobre a sua própria definição. Passages é um filme forte e com um impacto visual que não será fácil esquecer, mas deixa a sensação de que beneficiaria com o desenvolvimento da componente reflexiva das personagens e com a atribuição de mais tempo e espaço aos actores para comporem as suas personagens.