O Cinéfilo Preguiçoso, além de desejar um feliz 2018 a todos os seus leitores, viu dois filmes durante a época festiva. Em Roda Gigante (2017), Woody Allen mostra mais uma vez o seu interesse por personagens femininas poderosas mas emocionalmente frágeis e a quem os incidentes da vida e as suas próprias escolhas encurralaram num beco sem saída – recordemo-nos, por exemplo, de Melinda e Melinda (2004) e de Blue Jasmine (2013). A personagem principal, Ginny (Kate Winslet – excelente como sempre), empregada de mesa num restaurante do parque de diversões de Coney Island, falhou por completo uma carreira de actriz sobre a qual continua a fantasiar. Ironicamente, esse desencanto coincide com a percepção de que o destino a obriga permanentemente a representar um papel na vida real. Esta ideia da vida como representação é um leitmotiv do filme, reforçado pelo narrador (Justin Timberlake), um nadador-salvador que também é estudante de dramaturgia e que se envolve romanticamente com Ginny e com a enteada desta (Juno Temple). Para lá desta ideia principal e das fantasias polícromas que o grande Vittorio Storaro se permite, reforçando o lado kitsch e artificial do filme, passado quase exclusivamente num ambiente de feira, Roda Gigante acrescenta pouco à filmografia de Allen. Da mesma maneira, O Amante de um Dia (2017) é o tipo de filme incapaz tanto de conquistar os mais refractários à estética de Philippe Garrel como de afugentar os seus fãs. Mais uma vez, Garrel mostra-nos personagens aprisionadas nas armadilhas do amor e do ciúme, embora plenamente conscientes destas e resignadas com as consequências. A cidade de Paris, filmada num preto-e-branco sóbrio e quase lúgubre (obrigado, Renato Berta), é o cenário apropriado para um enredo simples de matriz realista, mas que deixa espaço para um lirismo discreto. Ninguém sai indemne dos filmes de Garrel; contudo, a resiliência moral das personagens propicia frequentemente finais quase felizes, em que o instinto de sobrevivência, mais do que a sabedoria, vem ao de cima.