Depois
de, há alguns meses, ter visto Suspiria de Dario Argento (1977), o
Cinéfilo Preguiçoso decidiu ver, em DVD, Suspiria, o remake realizado
por Luca Guadagnino (2018). São filmes muito diferentes. Enquanto o primeiro
era breve, intenso e cheio de cores primárias e ritmo, envolvendo o espectador
numa atmosfera de conto de fadas ou pesadelo, sem lhe dar tempo para duvidar do
bom gosto e das inverosimilhanças de certos momentos, o segundo é pesado, de
cores apagadas, ambiciona integrar no seu enredo subtextos culturais e políticos
sofisticados, e sobrecarrega o espectador com sequências de suposto terror que
provocam distanciamento em vez de convencer. Como conseguiu Guadagnino estragar
tudo? Em primeiro lugar, não contente em usar apenas o filme de Argento como
inspiração, saturou Suspiria com imagens e referências da época sem as
digerir coerentemente. Ao longo do filme, o espectador dá por si a recordar, entre
outras influências, Fassbinder, Kubrick, os filmes O Exorcista (William
Friedkin, 1973) e As Vidas dos Outros (Florian Henckel von Donnersmark,
2006), ou as figuras de Pina Bausch (clara inspiração para a Madame Blanc de
Tilda Swinton) e de Francesca Woodman. Em segundo lugar, Guadagnino complicou
desnecessariamente a narrativa principal com enredos secundários relacionados
com: referências ao Holocausto e ao nazismo; as actividades terroristas dos
Baader-Meinhof, um grupo de guerrilha urbana comunista e anti-imperialista; um
psicanalista (igualmente interpretado por Tilda Swinton) que procura a mulher
judia desaparecida durante a guerra; sequências com a família menonita da
protagonista no Ohio, onde a sua mãe moribunda continua a recriminá-la; e um feminismo
dúbio que parece sugerir que só transformando-se em bruxas as mulheres conseguem
exercer algum poder. As pessoas que gostaram deste remake descreveram-no como
um filme sobre a criatividade, pelo facto de a protagonista (Dakota Johnson)
ser capaz de se afirmar, apesar de no início as bruxas quererem silenciá-la, oferecendo
o seu corpo à Mãe Markos, para que esta deusa demoníaca que lidera a companhia
da dança continuasse a viver através do seu corpo jovem. Dir-se-ia, no entanto,
que, ao contrário da sua protagonista, Guadagnino se deixou engolir por todas
as referências, inspirações e complicações de que se socorreu, sem conseguir falar
com a própria voz e produzir um filme convincente. O Cinéfilo Preguiçoso fica
com a impressão de que Dario Argento se limitou a tentar fazer um filme de que
gostasse e que o divertisse, e, por isso, acabou por fazer um filme memorável, de
que ainda hoje falamos. Pelo contrário, Guadagnino ambicionava fazer uma
obra-prima inesquecível e o resultado foi um filme falhado, que soçobra com o
peso de tudo aquilo com que o realizador o carregou. Não vamos esquecer a
excelente banda sonora de Thom Yorke e é possível que continuemos a pensar em
alguns momentos do filme, mas quase sempre por maus motivos.