18 de fevereiro de 2024

O Grupo

O Cinéfilo Preguiçoso continua interessado em ver filmes de Sidney Lumet, e o DVD de O Grupo (1966), baseado num romance de 1963 de Mary McCarthy com o mesmo título, já estava na lista de espera há algum tempo, não só pela associação a esta escritora e a este realizador, mas também por ser considerado uma espécie de precursor de séries como O Sexo e a Cidade e Girls. O enredo segue a história de um grupo de oito raparigas de classe alta que, depois de terminarem o curso em Vassar, em 1933, têm de enfrentar a vida real – entre a Grande Depressão e o início da Segunda Guerra Mundial. Dentro da obra de Lumet, podemos associá-lo a Doze Homens em Fúria (1957), também um retrato colectivo (embora no masculino) em que a individualidade das personagens não se perde. Aliás, em O Grupo, temos pena de não poder acompanhar a história de cada personagem individualmente, à medida que a narrativa avança, pontuada tanto pelo boletim informativo que anuncia casamentos, nascimentos e conquistas profissionais das colegas de faculdade, como pelas conversas em que as personagens, em grupos mais pequenos, comentam depreciativamente estes acontecimentos. Para encontrarmos uma personagem feminina próxima destas na obra de Lumet, teremos de a procurar na intensidade de Diana (Faye Dunaway) em Network (1976). Dando por si num mundo muito diferente daquele para o qual foram preparadas, as protagonistas do filme reagem com uma intensidade histérica e febril, o que terá levado Elizabeth Bishop a classificá-lo como um dos piores filmes que já tinha visto. O tom do livro, no entanto, como é típico da obra de McCarthy, é mais distanciado, cáustico e satírico. Ainda assim, o contraste entre o livro e o filme não é totalmente desinteressante. Já houve quem recordasse a obra de Whit Stillman a propósito desta longa-metragem, mas talvez fosse mais correcto dizer que se Whit Stillman alguma vez realizasse um filme de terror sobre ser mulher e tivesse Boris Kaufman como director de fotografia, o registo seria muito próximo deste. Mary McCarthy é impiedosa com as suas personagens, sujeitando-as a problemas financeiros, casamentos com homens prepotentes, dificuldade de obtenção de métodos contraceptivos, alcoolismo, violência doméstica, doenças mentais verdadeiras e falsas, etc. Quase ninguém escapa à infelicidade e nenhuma teorização das protagonistas sobre as suas próprias vidas as ajuda a assimilar o desapontamento. É interessante constatar que o livro de McCarthy tem alguma inspiração biográfica. A personagem mais próxima da autora é Kay (Joanna Pettet), precisamente aquela que acaba por ser mais punida pela incapacidade de se adaptar ao contraste entre os ideais e a realidade. Tal como Mary McCarthy, Kay casa-se uma semana depois de terminar a faculdade, com um aspirante a dramaturgo (interpretado por Larry Hagman, o JR da série Dallas). Num episódio sinistro, o marido alcoólico e infiel de Kay decide interná-la num hospital psiquiátrico sem o seu consentimento, como aconteceu à própria McCarthy, no seu segundo casamento, com o escritor e crítico Edmund Wilson. Mesmo que ver este filme de Sidney Lumet não seja sempre uma experiência agradável, continua a ser uma obra interessante graças à sua agilidade narrativa, ao interesse histórico, à riqueza das personagens e à sua influência em narrativas posteriores sobre mulheres.