Esta semana, o Cinéfilo Preguiçoso decidiu ver mais um filme da fase americana de Max Ophüls. Protagonizado por Barbara Bel Geddes, James Mason e Robert Ryan, Caught (1949), que está disponível no YouTube, é uma adaptação do romance Wild Calendar, de Libbie Block, e conta uma espécie de conto de fadas invertido, em que a protagonista faz o casamento rico com que sonhava, mas percebe que não é feliz se tiver de viver fechada num palácio. Embora apresente algumas marcas estilísticas do cinema de Ophüls, como longos travellings, a obsessão com escadas, e a exploração dos contrastes entre a luz e as sombras, ou o luxo e a pobreza, talvez não seja o filme mais característico do realizador. Em Caught, a protagonista tenta libertar-se da inevitabilidade irracional que costuma reinar nos filmes de Ophüls. Para esse fim, é essencial a atitude prática e sensata de uma actriz como Barbara Bel Geddes, que conhecemos bem de Vertigo (Hitchcock, 1958) e da série Dallas. Robert Ryan costuma ser muito elogiado enquanto «actor do Método», sendo por vezes comparado a Marlon Brando, mas aqui interpreta com grande rigidez e excesso de tiques o papel de milionário instável (supostamente inspirado por Howard Hughes, que Ophüls detestava). Já James Mason, apesar de ter aceitado o papel de jovem médico idealista por ser diferente das personagens manipuladoras que costumavam atribuir-lhe, enriquece a personagem com alguma ambiguidade, fazendo-a parecer menos totalmente boazinha e até mais manipuladora do que originalmente seria. Se, em The Reckless Moment (1949), realizado logo a seguir, James Mason interpreta um mau que afinal é bom, em Caught interpreta um bom que nos faz suspeitar de que pode vir a ser mau. Numa época em que não se reflectia tão exaustivamente sobre o tema da masculinidade tóxica, o filme explora esta questão de modo interessante, em articulação com um certo imaginário feminino (associado à preocupação de ser uma princesa, num casamento com um homem rico) de que a masculinidade tóxica se alimenta de forma indissociável. Caught pode ser visto como a descrição de uma aprendizagem de vida: a personagem principal é obrigada a lidar com o mundo real e com os seus dilemas, muito mais complexos do que aqueles para os quais a escola de boas maneiras a preparou. A aprendizagem não fica concluída, porque, no final do filme, embora a protagonista se tenha libertado da armadilha do casamento infeliz com um milionário, ainda não descobriu realmente o que pretende da vida. A contrário dos contos de fadas tradicionais, o desfecho é ambíguo e só com muito boa vontade pode ser considerado “feliz”.
Outros filmes de Max Ophüls no Cinéfilo Preguiçoso: Divine (1935); Yoshiwara (1937); Sans Lendemain (1939); Carta de Uma Desconhecida (1948); The Reckless Moment (1949); La Ronde (1950); Le Plaisir (1952).