21 de outubro de 2018

Drôles d'Oiseaux


O Cinéfilo Preguiçoso tinha optado por não ver o filme Drôles d’Oiseaux (2017) quando este foi exibido na secção de Antestreias da Festa do Cinema Francês de 2017, na esperança, ingénua, de que à antestreia se seguisse a estreia. À falta desta, cansado de esperar, comprou o DVD. Drôles d’Oiseaux, segunda longa-metragem de ficção da realizadora francesa Élise Girard, integra numerosos elementos narrativos que já foram explorados até à exaustão em dezenas de filmes: a jovem (Lolita Chammah) que chega da província para tentar singrar em Paris, o livreiro idoso e misantropo (Jean Sorel), um passado misterioso, um subenredo político/ecológico, uma história de amor improvável. Não faltam elementos cómicos (os maços de notas que o livreiro insiste em oferecer à jovem nas ocasiões mais inusitadas, um gato muito traquinas que rouba todas as cenas em que entra) e até uma pitada de realismo mágico (as gaivotas que caem fulminadas por um mal desconhecido). É notável a maneira como Girard (e a co-argumentista Anne-Louise Trividic, colaboradora habitual de Patrice Chéreau), a partir de um enredo banal, constroem um filme delicadíssimo, repleto de momentos contemplativos, elipses e diálogos desconcertantes. Em mãos menos hábeis, a tentativa de situar o filme num híbrido de policial, comédia romântica e realismo poético urbano resultaria inevitavelmente num objecto amorfo e sem interesse. O principal feito de Girard é o de nos oferecer, a partir de materiais tão simples, um filme cativante e singular que pode ser descrito como um relato na primeira pessoa de uma luta para esconjurar a solidão e encontrar um lugar no mundo (ou em Paris, o que vai dar ao mesmo). Única nota negativa: o subaproveitamento de uma actriz excelente como Virginie Ledoyen num papel secundário pouco desenvolvido. Os cinéfilos não deixarão de reconhecer, no actor Jean Sorel, o marido de Catherine Deneuve em Belle de Jour (Buñuel, 1967). Por fim, confirma-se que é sempre boa ideia contar com um director de fotografia como Renato Berta quando se quer filmar em Paris: recorde-se As Noites da Lua Cheia (Éric Rohmer, 1984), Rendez-Vous (André Téchiné, 1984) e O Amante de Um Dia (Philippe Garrel, 2017). 


Outros filmes com livrarias no Cinéfilo Preguiçoso: 84 Charing Cross Road  (David Jones, 1987); Café Lumière (Hou Hsiao-hsien, 2003); Ramiro (Manuel Mozos, 2017);  A Livraria (Isabel Coixet, 2017).