A dada altura, no filme Minha Mãe, de Nanni Moretti (2015),
Margherita (a personagem da realizadora, representada por Margherita Buy)
explica a uma actriz atónita: “Não quero ver só a personagem; também preciso de
ver a actriz.” Talvez seja mais fácil compreender esta afirmação se pensarmos
nas figuras principais de Minha Mãe:
dois filhos que vão perder a mãe. Até aqui, na obra de Moretti, o realizador
representou sempre, se não o papel do protagonista, pelo menos alguém cujos
comentários ou intervenções eram essenciais para o desenrolar da acção. Neste
filme, em contraste, a sua personagem apaga-se e mantém-se em silêncio durante
a maior parte do tempo. A vertente verbal das crises cabe a Margherita,
personagem que parece ter sido fabricada precisamente para que Nanni
conseguisse ouvir-se e ver-se a si próprio não só como realizador, mas também
como filho em luto, replicando e clarificando o desdobramento sugerido na
direcção de cena por Margherita.

