No documentário Um Nome para o Que Sou (Marta Pessoa, 2022, visto num canal de televisão), recupera-se o livro As Mulheres do Meu País, de Maria Lamas (publicado em fascículos entre 1948 e 1950), e tenta-se compreender a sua importância actual, refazendo o percurso que Lamas fez por Portugal nessa época para dar a conhecer a realidade em que viviam as mulheres portuguesas. O Cinéfilo Preguiçoso chegou ao documentário depois de ler o excelente livro Lenços Pretos, Chapéus de Palha e Brincos de Ouro, de Susana Moreira Marques (Companhia das Letras), que foi desenvolvido a partir do comentário em voz-off do filme. Um Nome para o Que Sou é um documentário que se dispersa um pouco entre várias ideias, nem todas bem exploradas. As mais interessantes relacionam-se com os contrastes e/ou proximidades entre o passado que o livro investiga e o presente em que vemos o filme. O que resulta bem no livro nem sempre resulta no filme: a vertente mais auto-reflexiva e pessoal do comentário em voz-off parece desnecessariamente palavrosa. Como se salienta a dada altura numa imagem que mostra um texto, no cinema convém filmar em vez de falar, mas isso nem sempre acontece neste documentário. Outro ponto fraco é o uso um tanto decorativo de paisagens que ficam por identificar. Os melhores momentos são aqueles em que as ideias são exploradas através das imagens e não só das palavras: os documentos e apontamentos de Maria Lamas, as fotografias e ilustrações que usou no livro, e as entrevistas a algumas mulheres que aparecem nas fotografias, ou às suas descendentes, em que se comentam as diferenças entre o passado e o presente. Uma das sequências mais especiais do filme é aquela em que jovens dos nossos dias são convidadas a ler excertos do livro de Maria Lamas: as diferenças entre as raparigas de agora e as do passado, a forma como se vestem e falam, o peso e o desconforto do livro nas mãos, as dificuldades ou o entusiasmo da leitura em voz alta, falam por si. O filme mostra com sucesso a importância do livro de Maria Lamas e o arrojo da tarefa que levou a cabo, numa época em que as mulheres ainda eram mais secundarizadas do que actualmente. O facto de as imagens captadas e descritas por Maria Lamas parecerem, mesmo às descendentes das mulheres ali representadas, vir de um mundo distante e quase mítico que nem sempre temos a certeza de ter existido mostra bem que continua a ser necessário dar visibilidade a estas mulheres e a este livro, que está a sair outra vez em fascículos, com o jornal Público.