Nos anos
80 e 90, Manoel de Oliveira era amiúde remetido para a categoria de realizador
para as elites intelectuais e acusado de fazer filmes impenetráveis pela
perspicácia do cidadão comum. Passadas duas ou três décadas, superadas todas as
expectativas de longevidade e de reconhecimento internacional, as reacções à
morte deste realizador insistem de forma surpreendente na sua faceta mais
ligeira: repetem-se em círculo as anedotas ligadas à boémia dos anos 20 e ao
salto com vara ou as momices chaplinescas. Talvez a vontade de privilegiar esta
imagem mais superficial e clownesca surja como reacção às pulsões hagiográficas
que se manifestaram e continuarão a manifestar (ah, o Panteão!), mas não há
desculpa para remeter para segundo plano a extraordinária dimensão e
complexidade artística da obra de Oliveira. A melhor homenagem é ver e rever os
filmes. Para isso seria importante que estes estivessem mais acessíveis, ou em
sala ou em DVDs a preços aceitáveis.