Esta
semana estreou o filme mais recente de Jean-Luc Godard. Será que o Cinéfilo
Preguiçoso o viu? Não, por causa dos horários estapafúrdios em que o filme
passa. Os leitores desta crónica, portanto, terão de se contentar com as
impressões do Cinéfilo sobre um filme que há algum tempo queria ver, embora
temendo o pior: Godard,
O Temível (2017), de Michel Hazanavicius – em francês, Le Redoutable. Baseado em Un an après (2015), um livro de
memórias de Anne Wiazemsky, o filme acompanha a relação desta actriz (e neta do
escritor François Mauriac) com o realizador franco-suíço durante uma fase da
carreira deste em que, um pouco antes e um pouco depois de Maio de 68, as
preocupações políticas ocuparam um lugar predominante nos seus filmes. Apesar
de alguns momentos irritantes, muitos deles concentrados nos vinte minutos
iniciais, Godard, O Temível não é tão
detestável como se poderia imaginar. Explorando Godard enquanto figura pop, uma
dimensão que o próprio soube cultivar, Hazanavicius retém os aspectos mais
decorativos da estética de alguns filmes do realizador (nomeadamente da segunda
metade dos anos 60) – o esquema cromático, o guarda-roupa, o uso de
intertítulos –, e concentra-se nas
características mais infames da personalidade de Godard: um certo moralismo; a
tendência para se levar demasiado a sério, exigindo o mesmo dos outros; a
rispidez; a manipulação emocional; o gosto pela provocação. Ainda assim, a escolha
de Louis Garrel para interpretar o papel de protagonista acaba por tornar a
personagem menos desagradável, aligeirando-a. Sobre Godard, estamos habituados
a reacções extremas: de um lado, os adeptos incondicionais; do outro, os
adversários que o consideram um rezingão insuportável. O facto de este filme se
basear num relato de Anne Wiazemsky torna-o mais interessante: temos acesso à
perspectiva de alguém que, tendo amado, admirado e convivido intimamente com o
realizador, conhece e transmite bem tanto as suas qualidades como as suas
fraquezas. Além de ter alguns tiques que
Hazanavicius parece ter importado desnecessariamente do filme O Artista (2011), Godard, O Temível está muito longe de ser um grande filme, mas quem
se interessa por Godard não dará o seu tempo por perdido.