A
colecção de DVDs 120 Anos de Cinema Gaumont oferece aos cinéfilos deste país,
por um preço simpático, a possibilidade de rever obras de realizadores como
Godard (Paixão, Atenção à Direita), Renoir (Toni) ou Vigo (A Atalante),
entre outros. André Téchiné, cujos filmes têm estreado com alguma regularidade
em Portugal, está representado pela sua quarta longa-metragem: As Irmãs Brontë,
de 1979. Esta obra pode ser considerada uma raridade na filmografia do
realizador, pelo seu carácter biográfico e pelo trabalho de reconstituição
histórica. O período abarcado desenrola-se entre 1834 e 1852. É-nos mostrada a
vida quotidiana nas charnecas solitárias do Yorkshire, a estadia de Charlotte
(Marie-France Pisier) e Emily (Isabelle Adjani) em Bruxelas, o desgosto amoroso
do irmão das escritoras, Branwell (Pascal Greggory), antes do seu descalabro
físico e morte, a celebridade literária das irmãs (sob pseudónimos masculinos),
as mortes de Emily e Anne (Isabelle Huppert) e a crescente intimidade entre
Charlotte e o homem com quem viria a casar. Do princípio ao fim, o filme é
esteticamente coerente e fiel a um objectivo: representar momentos escolhidos
das vidas destas criaturas extraordinárias, abdicando do pathos ou de qualquer veleidade de virtuosismo. Não existe aqui um projecto
teórico com o fim de recorrer à vida para explicar a obra. Contudo, os interiores
soturnos e opressivos, a não menos opressiva imensidão das charnecas que Emily
percorre a pé, os episódios domésticos, todos eles evocam com um pudor notável
os ambientes e as personagens que viriam a povoar os romances que trouxeram
fama global às irmãs. O esboço de vida mundana que Charlotte protagoniza, no
final do filme, ajuda a realçar a extrema solidão que ela e os irmãos viveram e
que serviu de cadinho para os romances que produziram. Uma palavra final para o
trabalho magnífico do grande Bruno Nuytten na fotografia, assim como para as aparições
especiais do crítico e realizador Pascal Bonitzer (co-argumentista deste filme)
e (mais surpreendentemente) de Roland Barthes, no papel do romancista William
Thackeray.