Este ano, o Cinéfilo
Preguiçoso só assistiu a uma sessão do Doclisboa, aquela que reuniu Le Saphir de
Saint-Louis, de José Luis Guerín (2015), e The Outrage,
de Marc Karlin (1995). A pintura e as suas projecções na vida e na História são
o denominador comum destes dois filmes. Da obra do espanhol José Luis Guerín,
além dos filmes que foram passando no Doclisboa, o público português conhece
pelo menos o poético Comboio de Sombras (1997), que estreou em sala, podia
conhecer Na Cidade de Sílvia (2007), porque vale a pena e é fácil de
obter em DVD, e poderá ver A Academia das Musas (2015) no LEFFEST.
Le
Saphir de Saint-Louis localiza-se na Catedral de Saint-Louis em La
Rochelle, prestando atenção aos pormenores de uma pintura que recorda uma
tragédia ocorrida em 1741 numa escuna que transportava escravos. É notável como
a exploração meticulosa de alguns centímetros quadrados de tela evoca tão
poderosamente a História, a geopolítica e a tragédia humana em toda a sua
crueza. Realizado por Marc Karlin (1943-1999), ‘o realizador desconhecido mais
importante a trabalhar no Reino Unido durante as últimas três décadas do século
XX’ segundo um obituário, The Outrage parte da pintura de Cy
Twombly para produzir uma reflexão mais geral sobre a importância da beleza e
da arte na vida das pessoas, um tema controverso que, mesmo neste filme, dá
origem aos depoimentos mais contraditórios. Apesar de se apoiar numa estrutura
supostamente narrativa, alegadamente contando a história de M, uma personagem
que vê a sua vida insignificante abalada pelas reflexões suscitadas por um
quadro de Cy Twombly, The Outrage transcende de vários modos
estas coordenadas mais convencionais e é um filme verdadeiramente livre,
propondo uma abordagem original de um tema já discutido até à exaustão. Ainda
bem que todos os anos é possível ver filmes sobre arte e museus no Doclisboa.