A
característica mais invulgar do filme Hannah
Arendt, de Margarethe von Trotta
(2012), é ter como protagonista uma filósofa. Não é todos os dias que se
realizam filmes com temáticas relacionadas com a filosofia. Além disso, é
difícil encontrar mulheres que recebam atenção na História desta actividade.
Como
filmar o pensamento, algo supostamente interior? Em Hannah Arendt, encontramos pelo menos três maneiras de resolver
esta dificuldade.
Primeiro,
o eixo central representa e explora um ataque ao pensamento. Este filme gira em
torno de um episódio específico – o julgamento do nazi Adolf Eichmann que
decorreu em Israel entre 1961 e 1962 –, abordado nos artigos polémicos que a
filósofa escreveu sobre este assunto para a revista New Yorker. Nestes textos, Arendt (interpretada por Barbara Sukowa)
descreveu o nazismo como um atentado à própria actividade de pensar. Visto que,
de acordo com Arendt, pensar implica o “eu” num “nós” maior, que corresponde à
humanidade, qualquer tipo de genocídio só pode derivar da incapacidade de
pensar ou de um fracasso do pensamento.
A segunda
maneira como este filme mostra o pensamento é explorando as reacções que a
actividade de pensar, quando é verdadeiramente independente, pode desencadear (discussões,
incompreensões, inimizades, ataques, cartas de protesto, ameaças, etc.) de
ambas as partes em questão.
Por último, mas tão ou mais
importante, o filme não ignora uma terceira dimensão do processo de pensar, mais individual, intimista e difícil de captar, através da qual testemunhamos o quotidiano de Hannah
Arendt, a dar aulas, a cozinhar, em conversa com o marido, com a amiga Mary
McCarthy ou com a assistente, mas também sozinha, a reflectir, debatendo-se com
a dificuldade de escrever, deitada num sofá, a fumar, olhando pela janela ou
caminhando. Não é por acaso que Hannah
Arendt termina precisamente com um plano na penumbra da protagonista estendida num sofá, em silêncio, simplesmente a fumar e a pensar.