O
documentário Uma Discussão com 50 Anos
(The 50 Year Argument, 2014),
co-realizado por Martin Scorsese e David Tedeschi, segue um figurino muito
semelhante ao de outros que o Cinéfilo Preguiçoso abordou anteriormente, como Trespassing Bergman ou Vida Activa: O Espírito de Hannah Arendt:
uma sucessão de depoimentos intercalados com imagens de arquivo. Será que este
formato reúne aceitação consensual entre a comunidade documentarista como o
modo mais eficaz de discutir ou homenagear uma personalidade ou instituição? O
pretexto deste filme é a festa do 50.º aniversário da revista New York Review of Books, fundada em
1963. O tom combina bem com a ocasião: a grande maioria das intervenções assumem
um tom francamente laudatório do espírito da revista, da sua tradição de
independência intelectual e intervenção em questões sociais (da guerra do
Vietname ao movimento “Occupy Wall Street”) e, em particular, da personalidade de
Robert Silvers, que a edita desde a fundação (em colaboração com Barbara
Epstein, até à morte desta, em 2006). A conduta predominante de Silvers enquanto
editor assenta numa ideia simples: convidar autores inteligentes e cultos a
escreverem sobre determinado livro ou assunto (não necessariamente dentro da
sua especialidade), sem intervir demasiado a não ser para sugerir leituras de
pontos de vista diferentes a debater. Analogamente, um
documentário onde se vêem e ouvem pessoas do calibre intelectual de Isaiah
Berlin, Susan Sontag, Mary Beard, Joan Didion, Mary McCarthy ou Timothy Garton
Ash não pode deixar de ser cativante, mau grado o formato algo convencional. É
talvez de lamentar que Scorsese e Tedeschi, apesar de um título que salienta a
importância da discussão de perspectivas divergentes na New York Review of Books, não tenham apresentado pontos de vista menos
abonatórios em relação a esta. O documentário funciona como um prolongamento em
forma de filme da festa das bodas de ouro desta revista que continua a insistir
na urgência de pensar e debater, numa era em que a superficialidade e a
intoxicação mediática ganham terreno a um ritmo assustador. (Nota final: no
final desta sessão, o Cinéfilo Preguiçoso teve a grata surpresa de se cruzar
com uma multidão que enfrentou a chuva para assistir à projecção de Vida Activa: o Espírito de Hannah Arendt,
no cinema Ideal.)