2 de abril de 2017

Eisenstein in Guanajuato


O filme Eisenstein in Guanajuato (Peter Greenaway, 2015), visto esta semana em DVD, relata um episódio da vida do Serguei Eisenstein (1898-1948) que tem lugar depois da estadia nos Estados Unidos deste realizador soviético a convite da Paramount, em 1930. Apesar da consagração internacional graças a filmes como A Greve (1925), O Couraçado Potemkine (1925) e Outubro (1928), Eisenstein não foi bem recebido pelos americanos, talvez por receio de uma qualquer influência comunista. Por esse motivo, o realizador, beneficiando do incentivo e do apoio financeiro de um grupo de intelectuais de esquerda, decidiu partir para o México com o objectivo de ali realizar um filme sem muito financiamento. O filme de Greenaway centra-se em Guanajuato porque Eisenstein, pretendendo filmar uma espécie de «museu dos vivos», passa pela cidade para visitar o Museu das Múmias, um «museu dos mortos», onde estão expostos os corpos mumificados por processos naturais que foram exumados dos túmulos do Panteão Municipal de Santa Paula. Com um material de base tão rico, as expectativas do Cinéfilo Preguiçoso eram elevadas. Greenaway encontra neste episódio terreno fértil para algumas das suas obsessões principais: o falhanço do acto criativo, a materialidade dos corpos, a relação entre a pulsão sexual e a pulsão artística, a presença da morte. Ainda assim, parece incapaz de trabalhar competentemente aquelas que deveriam ser as duas referências mais importantes do filme: Eisenstein e a cultura mexicana. Num filme sobre Eisenstein esperar-se-ia que a estética do realizador soviético tivesse mais impacto criativo, contaminando a estética de Greenaway. Do mesmo modo, as referências à cultura mexicana neste filme são turísticas e decorativas, nunca exercendo influência decisiva. Por conseguinte, ficamos com um filme com enquadramentos, cenários, personagens e cenas que qualquer fã de Greenaway já conhece de cor e salteado, com a agravante de a narrativa e o excesso de palavras, debitadas sobretudo pelo protagonista (Elmer Bäck, num overacting totalmente descontrolado), assumirem uma importância escusada na obra de um realizador conhecido e admirado precisamente por defender o cinema antinarrativo. Eisenstein em Guanajuato não é um mau filme e, apesar dos seus defeitos, contém mais motivos de interesse do que 90% dos filmes contemporâneos. Porém, confirma uma tendência para uma certa acomodação e repetição de fórmulas que decepcionam num autor tão criativo.