17 de setembro de 2017

Queen of Earth


Catherine, a personagem principal do filme Queen of Earth (2015), de Alex Ross Perry (de quem o Cinéfilo Preguiçoso já abordou Listen Up Philip e Golden Exits), sofreu recentemente um duplo trauma: a ruptura com o namorado e o suicídio do pai, um artista plástico famoso de cuja sombra ela nunca se conseguiu libertar. O filme divide-se entre duas épocas, separadas por um ano. Na actualidade, Catherine (interpretada por Elizabeth Moss, excelente como sempre), instala-se na casa de férias da amiga, Virginia (Katherine Waterston), onde já estivera no ano anterior, na companhia do então namorado. Uma quarta personagem, particularmente irritante, fornece um elo de ligação adicional entre os dois tempos: trata-se de Rich (Patrick Fugit), um vizinho que estabelece uma relação com Virginia e cuja superficialidade e sobranceria fomentam as clivagens e atritos entre as amigas. Os raccords entre as duas épocas são frequentes e súbitos, como se qualquer detalhe fosse suficiente para evocar a memória, agora dolorosa, do ano interior. Perry insiste em grandes planos e em diálogos que, muitas vezes, se transformam em monólogos. Praticamente não existe estrutura narrativa ou exploração do espaço que possam servir de escape: tudo se resume às emoções lidas nos rostos e às palavras, quase sempre usadas para ferir ou culpar. Os planos intercalares da natureza servem meramente para ilustrar a passagem do tempo. As efusões verbais funcionam como instrumento de catarse para as personagens, mas essas catarses nunca são definitivas e alternam com períodos de apatia profunda. Queen of Earth, no seu estilo quase bergmaniano (menos a dimensão espiritual), rigorosamente expurgado da ironia e sofisticação comuns no cinema independente norte-americano actual, é um filme profundamente honesto e lúcido sobre a maneira como planos emocionais distintos interagem de forma a precipitar a queda num abismo de insanidade, neste caso uma separação, uma amizade que se desagrega e a necessidade de se emancipar da influência póstuma de um ente querido que desapareceu. A ausência de qualquer sugestão reconfortante de que Catherine está no bom caminho para superar a crise faz parte dessa honestidade. Queen of Earth é o mais satisfatório de entre os três filmes de Perry que o Cinéfilo Preguiçoso teve a oportunidade de ver.