Esta
semana vimos O Dia Seguinte, de Hong Sang-Soo (2017). Este realizador coreano gosta de
jogar com a repetição. No início de O Dia
Seguinte encontramos um editor dividido entre três mulheres que poderiam
ser a mesma em três idades diferentes (juventude, início da idade adulta,
meia-idade): todas encenam crises emocionais à frente dele, com uma intensidade
francamente desajustada ao carácter medíocre e pusilânime da personagem. À
repetição do feminino neste filme, alia-se a simulação de uma repetição
estrutural: como em Sítio Certo, História
Errada (2015), O Dia Seguinte inclui
uma segunda parte que dá a ver de um modo diferente os episódios da primeira. A
dada altura percebemos que a situação mudou e, recordando o filme de 2015,
suspeitamos que se contará a mesma história, mas com alguns pormenores
diferentes. Sucede, contudo, que na segunda metade de O Dia Seguinte, apesar de Hong retomar as personagens da primeira
parte, procura-as tempos depois: não há narrativas alternativas, mas sim uma
prolepse tão discreta quanto inesperada. O caos emocional da primeira parte já
se converteu em resignação desencantada e os actos e personagens que pareciam
importantes nessa altura são reduzidos à insignificância. A terceira figura
feminina, da jovem que tanto interesse suscitara ao protagonista na primeira
parte, visita-o na editora e ele só a custo se consegue lembrar de quem ela
é; a segunda figura feminina (a amante, no início da idade adulta)
desvaneceu-se com o tempo; só a relação conjugal do protagonista permanece. Os temas, a
maneira despojada e lúdica de contar uma história e de enquadrar, assim como os
diálogos intermináveis, bem regados com soju,
são reconhecíveis por qualquer fã de Hong Sang-Soo, um cineasta extremamente
prolixo que atingiu uma fase na carreira em que se permite a reincidência e um
esboço de autocaricatura que se tornariam inevitavelmente irritantes num
realizador menor. Para lá do estilo e das preferências formais, aquilo que
interessa a Hong é, ainda e sempre, o amor, as consequências das escolhas individuais
e a fragilidade das relações humanas. Parecem assuntos banais: é preciso ver um
filme de Hong (mais do que um, de preferência) para perceber o que a sua
abordagem tem de profundamente original. Talvez este seja o maior elogio que se
pode fazer a um realizador de cinema.
Outros
filmes de Hong Sang-Soo no Cinéfilo Preguiçoso: The Day He Arrives (2011), Haewon e os Homens (2013), Right Now, Wrong Then (2015).