10 de dezembro de 2017

O Quadrado


Quanto vale a Palma de Ouro do Festival de Cannes? A questão é legítima em face de uma certa tendência dos júris das últimas duas ou três décadas para premiarem filmes isentos de mérito cinematográfico (Fahrenheit 9/11 de Michael Moore) ou francamente pomposos (Sono de Inverno de Nuri Bilge Ceylan, O Laço Branco de Michael Haneke) e realizadores simpáticos, mas que não ficarão certamente para a história (Jacques Audiard, Ken Loach). Há que reconhecer que, ocasionalmente, o galardão tem sido atribuído a obras-primas (Elefante de Gus Van Sant, O Tio Boonmee… de Apichatpong Weerasethakul) e a filmes ambiciosos que deixaram o Cinéfilo Preguiçoso bastante céptico mas que foram aclamados por alguma crítica (A Árvore da Vida de Terrence Malick, A Vida de Adèle de Abdellatif Kechiche). Antecipando desde já o balanço final relativo ao filme O Quadrado (Ruben Östlund, 2017), pode dizer-se que não traz desprestígio à Palma de Ouro mas também não a engrandece por aí além. O filme situa o seu enredo no mundo da arte contemporânea: uma exposição em torno de uma obra minimalista composta por um quadrado luminoso serve de pretexto ou catalisador para uma série de histórias, situações e vinhetas mais ou menos remotamente ligadas aos temas da confiança e da solidariedade. Um dos principais problemas do filme é a coexistência de várias linhas narrativas dispersas e pouco coesas: o argumento é um agregado de ideias que nunca chegam a formar um todo. Inevitavelmente, muitos dos episódios soçobram na inconsequência, como é o caso do envolvimento entre a personagem principal, director artístico de um museu de Estocolmo (Claes Bang – uma boa surpresa) e uma jornalista americana (Elisabeth Moss, cujo talento merecia uma personagem menos superficial). É também deprimente ver como Östlund escolhe um alvo tão fácil (a arte contemporânea) para as suas críticas contra a indiferença e hipocrisia da sociedade ocidental, sobretudo quando as críticas não primam pela subtileza (não falta sequer a anedota clássica do empregado de limpeza que varre parte de uma instalação). A capacidade de explorar o lado cómico das situações que descreve é um dos pontos fortes do filme, contrastando salutarmente com a obra de Michael Haneke, para citar o exemplo de um autor que se move em temáticas semelhantes e já recebeu duas vezes o prémio máximo em Cannes. O Quadrado é um filme que deixa algumas expectativas sobre o que Östlund fará quando, e se, aplicar às suas obras maior disciplina criativa e abdicar de atacar espantalhos para fazer crítica social.