14 de julho de 2019

Esplendor | A Mulher do Aviador


O Cinéfilo Preguiçoso assistiu à Double Bill deste sábado na Cinemateca, com os filmes Esplendor (Naomi Kawase, 2017) e A Mulher do Aviador (Éric Rohmer, 1981). No primeiro há uma rapariga com o difícil trabalho de fazer descrições de filmes para pessoas com deficiência visual. Uma das ligações possíveis com o filme de Rohmer tem a ver com o facto de haver neste duas personagens que criam uma descrição possível para explicar a relação entre outras duas, que vêem percorrer uma zona de Paris longe dos roteiros turísticos, no Parque Buttes-Chaumont e em redor. No filme de Rohmer, conclui-se que a descrição produzida está errada. Também a protagonista de Kawase tem de corrigir várias vezes a sua descrição depois de ouvir os comentários – alguns deles relativamente agressivos – dos consultores invisuais durante as sessões de teste. De resto, são filmes muito diferentes. Rohmer, que encetou aqui a série Comédias e Provérbios, aparentemente mais ligeira e menos premeditada do que a dos Contos Morais, sobressai sempre por conseguir a difícil proeza de fazer um filme leve, mas muito menos superficial do que outros supostamente mais sérios e pesados. Em A Mulher do Aviador estabelece-se um contraste entre uma relação fácil e uma relação difícil que só pode correr mal. Como sucede com tantas outras personagens rohmerianas, o protagonista mostra-se incapaz de tomar decisões que rompam o impasse sentimental. Esplendor, apesar de ter como interessante ponto de partida a profissão da protagonista e a relação desta com um fotógrafo que está a perder a visão, cai muitas vezes num sentimentalismo excessivo, ao contrário do que acontece, por exemplo, em Uma Pastelaria em Tóquio (Naomi Kawase, 2015), um filme que, não sendo excepcional, aborda uma situação complicada sem repisar desnecessariamente a desgraça. Em Esplendor, durante uma sessão de teste, uma consultora invisual comenta que sente que a narração da protagonista destruiu «todo o peso e toda a gravidade» do filme que descreve. O problema é que, ironicamente, na arte, nem sempre o peso e a gravidade são as melhores formas de expressar peso e gravidade. Pelo contrário, quando sobrecarregam o conteúdo, produzem precisamente o efeito contrário, que é o ridículo, associado ao desinteresse do espectador.