Para encetar a nova temporada, o Cinéfilo Preguiçoso, pouco interessado em Tarantino, recorreu ao videoclube de uma operadora de telecomunicações. Depois da Tempestade (2016) é a décima primeira longa-metragem de ficção realizada por Hirokazu Kore-eda, que viria a receber a Palma de Ouro no Festival de Cannes de 2018 pelo filme Shoplifters (2018). O Cinéfilo Preguiçoso ainda não viu mais nenhum filme de Kore-eda, mas, com base em Depois da Tempestade e nos resumos das suas outras obras, é tentador estabelecer uma filiação com autores japoneses como Ozu ou Naruse, pela maneira como estes trabalham narrativas baseadas em tensões familiares, situadas em ambientes domésticos predominantemente urbanos. Este filme centra-se em Ryota, um escritor recém-divorciado que, depois de ter escrito um romance premiado, tem de trabalhar como detective privado para sobreviver. Depois da Tempestade acompanha os esforços deste protagonista para se reaproximar do filho e se reconciliar com a memória do pai. Também as relações com a mãe, com a ex-mulher e com a irmã são exploradas; um dos aspectos mais conseguidos do filme é a maneira como evita secundarizar estas relações, mostrando como a evolução de Ryota enquanto pessoa depende criticamente da maneira como vê e é visto por todos os seus próximos. O filme é constituído por uma sucessão de episódios, quase todos protagonizados por Ryota, que culminam numa noite em que, para se abrigarem de um furacão, as personagens principais se vêem obrigadas a pernoitar no espaço confinado de um apartamento. Este é o momento mais forte de um filme que até ali se desenvolve de modo algo convencional, ainda que explorando subtilmente algumas temas interessantes, como a relação das várias personagens com a caligrafia ou com o dinheiro. A metáfora meteorológica e o huis clos forçado são estratagemas usados até à exaustão na história do cinema e de outras artes, mas Kore-eda, graças à sua sensibilidade e técnica, consegue resolver de forma simples e inteligente as diferentes correntes emocionais do filme. Não existe uma reconciliação no sentido clássico do termo: nada indica que as vidas das personagens irão sofrer alterações profundas, nem que Ryota porá a sua vida em ordem, resolverá os seus bloqueios e passará a cumprir as suas obrigações. Contudo, o espectador fica com a impressão clara de que algo mudou, e de que essa mudança pode ser o germe de um processo positivo capaz de mitigar o sofrimento e a desorientação de algumas personagens. Transmitir essa impressão com a economia de meios e a naturalidade não forçada que caracteriza Depois da Tempestade é o maior mérito de Kore-eda.