Uma nota
prévia de regozijo pela atribuição do Urso de Ouro para melhor documentário a Balada de Um Batráquio, de Leonor Teles,
e do Urso de Prata para melhor realização a Mia Hansen-Løve, cujo filme
anterior, o muito recomendável Eden,
já foi elogiado pelo Cinéfilo Preguiçoso. Tudo isto aconteceu no 66.º Festival
de Cinema de Berlim. Passemos ao filme desta semana. Mistress America (2015) é a oitava longa-metragem realizada por Noah
Baumbach, não contando com Highball,
de 1997, renegada pelo próprio. Mais próximo de Frances Ha (e, tal como este, co-escrito pela actriz Greta Gerwig)
do que de While We’re Young ou Greenberg, este filme, ao contrário
destes dois últimos, não esboça a mínima tentativa de introspecção psicológica
ou de exploração das clivagens intergeracionais. O tom de comédia urbana
semeada de referências intelectuais remete-nos para um território bem povoado por
Woody Allen, Hal Hartley, Whit Stillman ou Wes Anderson (que colabora
frequentemente com Baumbach), mas nenhum destes foi tão longe na desconstrução
dos diálogos e situações, que surge ao mesmo tempo como uma homenagem e uma
subversão da screwball comedy levada
a extremos de requinte por cineastas como Preston Sturges ou Howard Hawks. Como
em Frances Ha, em Mistress America abundam os non sequiturs, os intervenientes são caracterizados
de forma assumidamente superficial e o argumento e os diálogos evoluem
aparentemente ao sabor das peculiaridades das personagens e em particular, por
um lado, da ideia fixa (abrir um restaurante) de Brooke (Greta Gerwig) e, por
outro, da narração de um conto que a primeira situação inspira a Tracy (cuja
intérprete, Lola Kirke, é uma revelação notável). O ponto de partida do filme é
a aproximação entre estas duas protagonistas, prestes a tornar-se irmãs por
afinidade devido ao casamento próximo (que acaba sendo cancelado) entre o pai
de uma e a mãe da outra. Esta premissa, no entanto, não passa de um ténue
pretexto para o desenrolar de situações e para um desfecho que nos revela, em
retrospectiva, algo completamente alheio à volubilidade e à inconsequência das
acções e peripécias precedentes: duas pessoas que procuram o seu lugar no
mundo, cujas trajectórias colidiram brevemente e que agora partem para os seus
destinos, um pouco mais ricas por se terem visto reflectidas na percepção da
outra.