10 de julho de 2016

Finding Vivian Maier



Numa semana muito triste por causa da morte de Abbas Kiarostami (1940-2016), o Cinéfilo Preguiçoso viu em DVD o documentário Finding Vivian Maier, realizado por John Maloof e Charlie Siskel (2013) depois da descoberta num leilão de uma caixa de negativos de uma extraordinária fotógrafa até então totalmente desconhecida. O documentário assume uma abordagem detectivesca, através da qual o próprio John Maloof, que comprou a caixa com a intenção vaga de usar algumas fotografias num livro sobre a história de um bairro de Chicago, descreve o percurso que seguiu a partir do momento em que percebeu o valor artístico da descoberta. Para tentar conhecer a autora das fotografias, Maloof explorou exaustivamente todos os objectos pessoais que conseguiu reunir contactando as pessoas para quem ela tinha trabalhado como ama. Esta estrutura aparentemente convencional, baseada em entrevistas cuidadosamente montadas para permitir a revelação gradual dos vários aspectos da personalidade e biografia de Vivian Maier,  garante-nos acesso à obra que vai sendo mostrada, às dúvidas e perplexidades, bem ou mal resolvidas pela investigação, de Maloof, assim como aos testemunhos daqueles que conheceram a artista. Contudo, talvez uma das características mais interessantes do documentário resida na exposição das lacunas da investigação, que nunca assegura uma compreensão abrangente e satisfatória da figura investigada. Ironicamente, os depoimentos incluídos revelam mais sobre quem fala do que sobre o assunto da conversa. Nenhuma das pessoas que a conheceram e que com ela viveram – mais ou menos fluentes, mais ou menos estranhas, mais ou menos paranóicas ou indiferentes e desatentas – se interessou o suficiente por Vivian Maier para se dar conta do valor da obra e da artista, descrita quase sempre apenas como uma acumuladora de objectos excêntrica e reservada, dotada de arestas que não lhe permitiam encaixar em lugar algum durante muito tempo. Curiosamente, só nos depoimentos de fotógrafos e críticos a propósito das fotografias de alguém que nunca conheceram pessoalmente alcançamos um visão mais completa de como Vivian Maier pode ter sido: a liberdade, o sentido de humor e de oportunidade, o espírito curioso, a sede de informação. Além de ser um documentário sobre uma fotógrafa prodigiosa, tão embrenhada nesta actividade que nunca divulgou o próprio trabalho, além de desencadear alguma reflexão sobre os mecanismos de consagração artística, Finding Vivian Maier é um filme sobre o mistério que cada um de nós representa para os outros. «Como conhecer alguém?» é uma das perguntas essenciais que coloca.