O Cinéfilo Preguiçoso continua a ver os filmes de Hirokazu Kore-eda disponíveis no videoclube das operadoras de telecomunicações. Shoplifters (2018) foi o filme que consolidou a fama deste realizador japonês, em parte graças à Palma de Ouro que lhe foi atribuída no Festival de Cannes. No argumento, detectam-se vários elementos presentes noutras obras de Kore-eda, em particular as relações intergeracionais, a transmissão de saberes entre ascendentes e descendentes e o modo como as afinidades e o livre-arbítrio condicionam as decisões de personagens em busca de integração num colectivo. Ao retratar um grupo de pessoas que partilham um tecto e uma existência no limiar da pobreza, mas que não estão ligadas por laços de sangue, Kore-eda dá primazia à discussão não só sobre o que constitui uma família mas também sobre o estatuto e a complementaridade do parentesco e dos afectos. Compreende-se, até certo ponto, o enorme sucesso de público e de crítica de Shoplifters: é um filme formalmente equilibrado e rico em conteúdo humano, com uma componente social e realista bastante forte. Contudo, faltam-lhe a subtileza e a contenção de uma obra como A Nossa Irmã Mais Nova (2015): a intenção de demonstrar que o parentesco, só por si, vale menos do que o afecto e as afinidades conduziu a algum sentimentalismo e à cedência a convenções do melodrama, sobretudo na parte final. Apesar de o recurso a estas soluções algo fáceis prejudicar o filme, há muito de interessante para descobrir e admirar em Shoplifters: a relação entre “pai” e “filho”, que faz lembrar Ladrões de Bicicletas (Vittorio De Sica, 1948); a coreografia silenciosa de gestos e deslocações nas cenas em que as personagens cometem os furtos que servem como fonte de receita para compensar os salários incertos; as cenas de interior numa casa minúscula em que a falta de privacidade devido à proximidade e dimensão minúscula das divisões é explorada habilmente.
O Cinéfilo Preguiçoso regressa em Setembro. Boas férias para todos.
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