Visto em DVD e baseado num romance de Dorothy
B. Hughes, In a Lonely Place (1950), de
Nicholas Ray, é sobre um argumentista de Hollywood estafado e com tendência
para ser violento (Dix Steele/Humphrey Bogart – num papel excelente que lhe
serve como uma luva) que se vê envolvido numa história estranha de homicídio
durante a qual conhece uma mulher por quem se apaixona (Laurel Gray/Gloria Grahame). In a Lonely Place é muitas vezes associado aos filmes Sunset Boulevard, de Billy Wilder, e All About Eve,
de Joseph Mankiewicz, ambos realizados no mesmo ano, devido à sua visão
desencantada sobre o meio do cinema, corporizada na personagem do actor
alcoólico em declínio que vai aparecendo ao longo do filme enquanto alter
ego não só do protagonista mas também do próprio cinema de Hollywood. Tudo começa com um livro que Dix Steele não
tem vontade de ler mas que lhe pedem que adapte ao cinema. Por acaso, a menina
do bengaleiro comenta que leu o livro todo. No dia seguinte, os jornais
anunciam: menina do bengaleiro morta depois de
argumentista a levar para casa para ela lhe contar uma história. (Coisas que
acontecem quando se faz tudo para evitar ler maus livros.) O homicídio por
resolver, de que Dix se torna automaticamente suspeito, permanece
obsessivamente na cabeça de todas as personagens, a ponto de a relação dos protagonistas
se tornar uma representação do arquétipo cinematográfico do casal em que um dos
elementos suspeita que o outro é um assassino, podendo a qualquer momento
matá-lo a ele também, uma figuração da ideia segundo a qual as pessoas que mais
amamos são precisamente as que mais nos podem magoar ou mais facilmente nos
podem destruir. Só o protagonista reage como parece reagir a tudo o que
acontece na sua vida: como se se tratasse de um acontecimento susceptível de
integração num argumento. Dix Steele chega mesmo a descrever a morte da
rapariga como um passo essencial da sua relação com Laurel Gray: “Há muito
tempo que te procurava. Uma rapariga foi morta e encontrei-te.” Num dos
momentos mais interessantes do filme, ele explica que uma boa cena de amor tem
de ser sempre sobre outra coisa além disso e assim acontece sempre
que este casal está em cena: neste filme, o amor é indissociável do medo e da
desconfiança e a linguagem corporal de Dix e Laurel contradiz muitas vezes o
que é dito nos diálogos. Todo o filme explora o potencial mortífero do
protagonista; ainda que este ao mesmo tempo seja retratado como homem
apaixonado e meigo, o espectador e as personagens nunca perdem o receio de um
dos seus acessos de agressividade redundar em morte. Deste modo, personagens e
espectadores estão sempre na posição de argumentista, tentando adivinhar o que
poderá passar-se a seguir e nunca podendo descontrair completamente. Por todos
estes motivos, In a Lonely Place é um filme inteligente, mas, talvez
pela sua associação (ainda que irónica) aos códigos do film noir e ao
contexto de uma época específica de Hollywood, também parece mais datado do que
On Dangerous Ground (1952), um filme que explora temas mais intemporais.