27 de junho de 2021

Eva – Director's Cut

O filme que o Cinéfilo Preguiçoso viu esta semana –  Eva (Joseph Losey, 1962) – passou recentemente na RTP, em versão Director’s Cut, com 135 minutos (com cortes à revelia do realizador, a versão que estreou originalmente durava 103 minutos). Eva baseia-se num romance com o mesmo título de James Hadley Chase, em que se conta a história de um escritor galês de classe operária que, graças ao sucesso alcançado com a adaptação para o cinema do seu primeiro romance, passa a mover-se nos meios mais sofisticados de Veneza e Roma. O mais interessante do filme de Joseph Losey é a atmosfera jazzística e fluida, assente em impressões e imagens fugidias dos espaços onde a acção decorre. Losey opta sempre por ângulos e enquadramentos inesperados, revelando a beleza às vezes ambígua dos espaços interiores e exteriores que explora. O menos interessante e mais datado é e a linha narrativa um tanto banal, sobre um homem aparentemente bem-sucedido com uma atracção fatal por uma prostituta de luxo que precipita a sua queda. O facto de depender tanto do estatuto de Jeanne Moreau como símbolo da «essência do feminino» naquela época exige alguma contextualização histórica aos espectadores de agora. Embora a interpretação de Jeanne Moreau seja interessante, é bastante parecida com a de muitos outros papéis que desempenhou no cinema de então, como em Os Amantes (Louis Malle, 1958) ou Jules et Jim (François Truffaut, 1962). Trata-se sempre de uma personagem sedutora e sexualmente franca, com uma presença magnética e inexpressiva que, não se percebe bem como, atrai todos os homens com quem se cruza simplesmente por existir. O título do filme salienta a associação cansativa entre o feminino e o perigo, reflectindo um subtexto bíblico muito forçado e que nada acrescenta de relevante. Inicialmente, a protagonista parece uma mulher sofisticada que cultiva os prazeres da vida com quem é capaz de os pagar. Ao longo do filme, apesar de a sordidez e o declínio desta personagem se tornarem evidentes, ela continua a manipular o escritor como bem lhe apetece. É possível que os espectadores que consigam desligar-se desta linha narrativa desconchavada apreciem a singularidade visual de Eva. Sem dúvida, os amantes de Veneza e Roma encontrarão aqui algumas imagens compensadoras, que por si só justificam o visionamento deste filme que envelheceu relativamente mal, apesar da desenvoltura formal e de uma banda sonora que se pretenderia vanguardista.